Quinta, 31 de julho de 2025, 01:41

Xadrez na Política

COLUNA

O CLUBE DA FOFOCA

Por Arnaldo Eugênio, doutor em Antropologia.

A fofoca é, enquanto fenômeno social complexo – bem como outros comportamentos humanos em sociedade –, uma invenção sociocultural, que pode assumir valores positivos ou negativos, dependendo do referencial de análise e das intenções individuais, que perpassam as ações sociais do fuxiqueiro.

A fofoca é causa de inveja, além de um controle no processo civilizatório que consiste numa “ação social”. Para Max Weber (1864-1920), a ação social é orientada em relação ao outro. Assim, há algumas atitudes individuais e coletivas que não podem ser consideradas sociais. Em geral, a fofoca é uma ação social com a finalidade de inventar, atiçar, bolar ou aumentar, subjetivamente, uma situação ou fato social para exercer controle.

Como um mecanismo de controle, a fofoca dá prazer e regozija o fofoqueiro – “a desgraça de poucos faz a alegria de muitos” –, e gera decadência e autofagia social, incluindo os boateiros – “morrem pela boca”. Empiricamente, 2/3 das conversações nas rodas sociais são fofocas e a mídia especializada em glorificar e bisbilhotar a vida privada lucra muito com escândalos e os fuxicos.

Porém, não raro vermos pessoas se dizendo vítimas de fofocas, mas quando indagadas se também fofocam, logo negam. E, quando confrontadas com a verdade, dizem apenas “ouvi dizer” ou que “comentaram”. Afinal, sabem que o estigma de fofoqueiro é depreciativo.

Para Weber, a ação social pode ser dividida em quatro ações fundamentais: a) ação social racional com relação a fins; b) ação social racional com relação a valores; c) ação social afetiva; e d) ação social tradicional.

Assim, ninguém está imune ao clube da fofoca, pois o alvo dependerá do interesse, do incomodo e da intenção, já que a capacidade inventiva do fuxiqueiro é ilimitada. Contudo, todo clube da fofoca tem pouca credibilidade, pois, na maioria das vezes, as maledicências vêm de uma inveja, do ciúme e/ou do apego.

Alguns pesquisadores alemães têm desenvolvido a teoria de que a fofoca é “positiva”, pois ajuda os indivíduos a desenvolverem um senso de cooperação, a construir sua própria reputação fora do ambiente familiar e a conquistar a confiança de outrem – algo positivo nas relações sociais. Nesse sentido, é pouco provável imaginar que existiu um grupo social sem a fofoca, onde as pessoas não pautassem as suas vidas em torno de expiação da vida alheia sem se preocupar com a sua própria vida e o espelho.

Atualmente, numa sociedade do espetáculo, o ser fofoqueiro é nocivo porque, em busca de visibilidade fácil e prestígio social sem limites, ele pode “plantar” fatos e notícias caluniosas, tentando torná-las naturais. Assim, é um ser social maligno, que tenta destruir a reputação da vítima, inventa fuxicos, espalha discórdias, finge-se de amigo, destrói relacionamentos e se vê imune às consequências de suas próprias mentiras.

Porém, a fofoca é uma moeda na estética da mercadoria, pois o fuxiqueiro sempre visa ganhar algo fofocando. Ela é intencional. No passado, a fofoca era um meio através qual as pessoas se informavam sobre quem era o outro ou o pretendente a matrim aos olhos sociais.

Contudo, o clube da fofoca tem um poder maléfico, tanto para quem faz parte quanto para quem o segue, ainda mais em situações afetivas, onde muitos tiram proveitos das mentiras, quando a reciprocidade, as dúvidas, a confiança e as reputações transferidas pela fofoca estão interrelacionadas ou aparentes.

Portanto, a sociedade desenvolveu uma compulsão humana pela informação sobre os outros. Logo, a fofoca faz parte da estrutura das relações sociais e pode ser estudada. Por isso, quase ninguém resiste a uma “boa fofoca”. O problema é o linchamento moral que subjaz as fofocas e esconde a índole do fofoqueiro.

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