música brasileira amanheceu mais silenciosa neste domingo (20). Morreu, aos 50 anos, a cantora, compositora, atriz e empresária Preta Gil. A artista, que lutava contra um câncer de intestino desde janeiro de 2023, não resistiu às complicações da doença, que havia retornado em 2024 após um breve período de remissão. A informação foi confirmada por sua assessoria de imprensa. A família deve se manifestar oficialmente nas próximas horas.
Filha do ícone da MPB Gilberto Gil e afilhada de Gal Costa, Preta nasceu cercada de música, arte e inquietude. E fez jus ao berço ao transformar sua própria história em palco para discussões urgentes sobre racismo, gordofobia, autoestima, feminismo e direitos LGBTQIA+. "Uma mulher preta, gorda, bissexual", como ela mesma se definia, que ousou ser quem era — e ainda mais: se fez escutar.

Preta Gil estreou na música com o disco Prêt-à-Porter em 2003, e desde então lançou diversos álbuns, incluindo Preta (2005), Sou Como Sou (2012) e Todas as Cores (2017). Ela se reinventou como artista pop, animou carnavais e eventos em todo o país, fundou o bloco “Bloco da Preta” — que arrastava multidões nas ruas do Rio de Janeiro —, e também se destacou no teatro, na televisão e como empresária do marketing digital com a Mynd8, agência que ajudou a fundar.
Mas seu maior espetáculo foi a vida vivida com intensidade, enfrentando o preconceito de frente, sem filtros. Ao longo da carreira, enfrentou críticas, rejeição e ataques racistas e gordofóbicos, mas nunca abaixou a cabeça. Preferiu transformar dor em discurso, luto em luta e doença em conscientização.
A batalha contra o câncer
Diagnosticada com câncer colorretal em janeiro de 2023, Preta passou por cirurgias complexas, quimioterapia, radioterapia e enfrentou situações críticas, como uma sepse que a levou à UTI. Mesmo debilitada, dividia com o público os detalhes do tratamento com coragem e dignidade. Falou abertamente sobre a bolsa de ileostomia que passou a usar após uma das cirurgias, quebrando tabus e ajudando a humanizar o debate sobre o câncer e a vida pós-operatória.
No fim de 2023, a doença parecia controlada. Mas, em agosto de 2024, novas metástases foram detectadas. A artista buscou tratamentos alternativos nos Estados Unidos e nunca perdeu a esperança. Continuou trabalhando, publicando nas redes e promovendo sua autobiografia, Preta Gil: Os Primeiros 50, lançada este ano. O livro celebra seus 50 anos de vida e conta sua trajetória da infância à maturidade, com lucidez, humor e sensibilidade.

Mulher de afetos
Mãe de Francisco, de 28 anos, e avó da pequena Sol de Maria, de 7, Preta sempre ressaltou o poder transformador do afeto. Viveu amores intensos e também foi traída publicamente durante o tratamento da doença, o que enfrentou com a mesma transparência e força que marcaram sua carreira. Dizia que “o amor cura” — e foi cercada de amor que viveu até o fim.
“Poder chorar no colo de quem me ama, sarar as feridas com aplausos e afeto, é um presente divino”, escreveu em uma de suas últimas postagens. Ela ainda participou de shows da turnê da Família Gil e, em cada aparição, emocionava plateias com sua força e entrega.
Um legado vivo
Preta Gil foi mais do que uma artista. Foi símbolo de liberdade, de aceitação e de luta. Inspirou mulheres, corpos dissidentes, artistas iniciantes e todos aqueles que, como ela, se sentiam “fora do padrão”.
Aos críticos, respondeu com talento. Aos que duvidaram, respondeu com sucesso. À doença, respondeu com coragem. E à vida, respondeu com alegria.
Seu legado não está apenas nos discos ou nas fotos. Está nos corpos libertos que ela ajudou a empoderar. Está nas mulheres que ousaram se amar. Está nas vozes que agora sabem que podem falar — e ser ouvidas.
Preta Gil partiu, mas a força do seu nome e da sua história permanecerá onde sempre esteve: no coração do povo brasileiro.
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